sexta-feira, julho 25, 2008

Te contei.


Ela obedeceu o despertador num dia de férias. Fez café e tomou café. Não teve tempo para usar o banheiro. Lamentou. Saiu apressada com o pedido da médica na mão. No carro, enquanto checava seus olhos no retrovisor, pensava que chegar com 3 minutos de atraso não significaria problema. Estavam sem remelas. Seria atendida. Hum, a música de fundo da Rita Lee a fazia relaxar. E sorriu para o retorvisor. Balançou o corpo numa dancinha sem explicação. É hoje que conheceria o monstro achatador de mamas. Desculpe o auê, eu não queria atrasar você, diz jocosa. Foi atendida. Começou a seguir ordens. Tirou a camisa e o sutiã. Duas mulheres, uma a tocava e outra a analisava de longe. Essa última com mais reprovação. Talvez seja um complô, ainda pensou. Não se mexa, olhe para cima com o ombro esquerdo apontado para baixo, afaste a perna direita em 5 centímetros, joelho voltado para fora. Assim, relaxa!, falou rindo a moça sabendo da impossibilidade da situação. Seu cabelo, peraí, deixa eu ajeitar esse cabelão...Então pegou a mama usando os 4 dedos para cima e o polegar oponente embaixo. A carne saltava, mas era delicada a moça. Esqueceu que estaria no pré mentruo. Azar dela. Então veio uma chapa na velocidade de um elevador em queda livre que despencou sobre a mama fazendo pressão. Nem dói nada, pensou. Sabia!, As pacientes se queixam à toa, na mente dela. A mulher de longe moveu a cabeça pra esquerda e direta. Entendeu. Lá vinha a guilhotina de novo naquela teta. A pressão incial fez com que abrisse dois ragos de mais ou menos 3 centímetros de cada lado. Saía um tanto de sangue. A mama é bastante vascularizada, lembrou. Então a máquina desceu sem titubear, mais certeira e definitiva. A mama pendeu de lado. Despreendeu-se do tórax deixando uma úlcera sangrante exposta. E o cabelão por cima. Cuidado senhora!, o cabelão pode infeccionar a ferida. Ah sim, tomou então cuidado. Virou a cabeça e pôde ver seu mamilo direito a encarando, sem reprovação. Por favor olhe para cima, soou de instantâneo a voz. Obedeceu, mas não saiu da cabeça a imagem da sua mama com carnes amarelas ao redor da pele caída no canto da sala. Quanta gordura tenho nas mamas, calculou. Se eu subisse na balança agora já daria diferença pra menos, continuou calculando com certa felicidade. Agora a contralateral, senhora. Gostaria me posicionar dessa vez, querida, tentou. As mulheres autoritárias não permitem essas inversões de papéis. E poderia se tratar de um complô, lembrou. Ela precisa usar seus pequenos poderes, continuou pensando. Ainda que soubesse a insólita posição, foi incapaz de repetí-la.
Ela arrumou como pode, o sangue agora já pingava e formava uma pocinha que dificultou a abertura da perna em 5 centímetro. E veio a máquina. A outra deve ter arrumado algo na força preensora da dita que desta vez foi numa vez só. E a outra mama pulou ao solo, para o outro lado. Meio que escorregando, a teta esquerda seguiu em direção a direita, estavam acostumadas a ficar juntas. Pronto senhora , pode vir buscar na sexta-feira. Nem vai me dar uma gaze, pensou, achando ruim com a mocinha. Pôs a blusa e deixou o sutiã lá, se tornou desnecessário. Não provoque, é cor-de rosa choque!, ah Rita Lee...Logo a blusa ficou manchada, já que não teve colaboração das funcionárias.

Sexta-feira pegou o resultado e levou para médica. A mesma não a desanimou, atestou normalidade. Mas se despediu aconselhando que buscasse de volta as mamas na clínica para que pudesse repetir o exame anualmente.


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Não sei que reação causa um texto desses a vocês, mas escrevi fazendo uma brincadeira com o genial livro que li também na semana passada, de contos, que me foi especialmente presenteado pela Lu Longuete, a da Felicidade com Tristeza no Mesmo Time.
O livro é:
Gran cabaret Demenzial, de Veronica Stigger, uma contista gaúcha.
Fui pega de surpresa, a beira da piscina, as histórias começam normais e ficam muito muito loucas, ela tem idéias bastante psicodélicas, super inteligentes. É um tanto escatológico. Imaginativo é quase um eufemismo. O que escrevi é apenas uma brincadeira, que passa longe do talento da moça.
Gostaria de saber o que você acharia de um livro assim.
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Do mais, fiz primeira mamografia e tudo vai bem!

um beijo, boa sexta,
TiTa

11 comentários:

Eu não sei, você sabe? disse...

a foto da mmg,captei na net!!!

FELICIDADEetrist... disse...

1 Captou na net? Pois eu já ia dizendo que está lipossubstituída e lindíssima a sua mama!
2 Buscou as pobrezinhas? Elas não vão passar um fim de semana inteiro fora de casa, né?
3 Sim, a Stigger é boa demais, doida demais, inteligente demais, uma coisa! Acabei ontem de eler o meu e já sei que quero achar o outro livro da moça! Escatológica, fixada em orifíco assim traseiros e cínica e bem-humorada! Aliás, eu já disse que foi no Letras e Leituras que eu a conheci. né? Eita programinha sensacional!
4 Sensacional messssmo é você! Conseguiu ser engraçadinha, didática, cínica e tudo mais! Amei quando a segunda cai e vai pro lado da outra, porque é onde está acostumada a ficar... que fofinhas!!!!
PARABÉNS E BESITOS!!!!!

FELICIDADEetrist... disse...

= ORIFÍCIOS

Pat Cachinhos disse...

Ahhhh que agonia!!!
Eu não sou médica e isso me dá um nervoso absurdo!!
Não consegui ver "Um Homem Chamado Cavalo" por causa da cena em que ele é pendurado por ganchos. Quase saí do cinema ao assistir "A Cela" pois tem coisas semelhantes. Não sei explicar essa minha total agonia ao ver essas coisas assim como não explico a aflição ao OUVIR alguém escovando o dente, é a mesma sensação que os outros tem - e eu não tenho - com unha arranhando o quadro negro.
Não se explica, se aceita!!
Cortes, poça de sangue, gordura saindo... aflição, agonia... não dá!!

Eu não sei, você sabe? disse...

pat!
obrigada bpor responder minha "enquete"
beijos

FELICIDADEetrist... disse...

Sabe (quer dizer, vc não sabe, mas OK), eu acho que vale a insistência no livro, sim. Preste atenção em como ele (o Sara) consegue não dar nome a ninguém e mesmo assim explicar tudo fácil. Veja como parece que vc conhece todos de tão bem estruturada a descrição. Se vc ainda estiver antes daquela pág 160 de que eu falei, faça uma leitura mais dinâmica até lá. Porque a partir daquele ponto, a história pega mais. E acho que será bem legal ter lido o livro todo pra ver o filme em breve. Tente por uns 2 dias, pra não cansar e nem dar bode, e me conte, ok??? Besitos mils!

Anônimo disse...

Bem escrito, Tita. Mostra um talento convergente à sua área profissional e certamente daí sua admiração pela autora do tal livro e esse embate sobre a psiquê e o carnal. Apesar da brutalidade em tom de descaso, consigo entender e gostar por apreciar o paradoxo, mas não pelo objeto.

Minha formação voltada para um campo mais lógico me leva para leituras distintas, mas dicotomias não menos intensas. Minha queridinha é a física quântica e todas as suas implicações filosóficas, que em analogia ao seu duelo, podemos citar matéria x consciência (aliás, meu Português anda a desejar... estou me referindo a consciência de "consciousness", não de "conscience".

Aliás, acho mesmo que profissionais de Medicina e Direito deveriam se inteirar mais sobre teorias quânticas, por motivos óbvios, mas infelizmente não vejo isto acontecer.

Se algum dia você escrever um livro nesta linha, juro que compro. Mas terei que me destacar de mim mesmo para ler, tanto do meu eu covarde quanto do sádico.

Beijo,

Anônimo disse...

Tita, deixei a dica que você me pediu lá no Indizível.

Beijo,

disse...

Tita, adorei o texto.
Domingo assisti o filme lipstick. Lindo demais!
Mais uma que comprará um livro seu se você publicar. O meu quero autografado. rs
Beijão!!!

Vivia disse...

O texto está divino... Adorei!
Que bom que está tudo bem...

Andrea Drewanz disse...

Vc é uma contista de mão cheia!
Adorei o texto. Além de ser bem-humorado, ele descreve realmente como é o exame.
Só quem já fez, pode dizer, né!?
Adorei as referências, principalmente as de Rita Lee.
Bjsss