segunda-feira, março 05, 2007

Pecados Íntimos



Em inglês, o filme americano dirigido por Todd Field, cujo nome "Little Children" teve a tradução para o português deturpada, causando tanto desconforto em mentes brasileiras já massacradas pelo tino comercial que insiste em dominar esse universo de traduções. Achar um nome para uma obra não é lá uma tarefa fácil. Um nome que seja conciso, forte e ainda indique o caminho a se percorrer é realmente difícil. Depois que ele foi encontrado, parece que circunda a peça, conferindo um começo e fim, por vezes justificando os meios. É interessante, pois nem para darmos nome a um filho temos esse poder, de invólucro protetor e propagador, em nossas mãos.

Posto isso, concordo com a maioria de críticas em que sente falta das "Crianças pequeninas" que o filme faz alusão, onde a ingenuidade da infância é trocada por algo tão contrário quanto aos Pecados Íntimos, que todo ser humano é susceptível. E concordei principalmente com as palavras de Fabiane Secches (que eu não sei quem é,mas li num site da internet):"As pequenas crianças do filme não estão correndo nos parques, ou sendo embaladas nos balanços, ou brincando na piscina... as pequenas crianças do título estão aprisionadas em seus corpos de adultos.". E é essa a questão. Ou uma delas, pois essa é a graça do filme, o que me atraiu e o que me atrai. A capacidade que a arte tem de nos fazer pensar, questionar, divagar e até modificar.
Entendo que vejo as pessoas nas ruas e não consigo acertar o que há por detrás de cada sorriso, de cada nariz, de cada cara feia, de cada cabelo ondulado castanho ou vermelho. Apenas posso imaginar. Mas reconheço duas coisas(e já escrevi sobre isso): que adoro exercitar esse hábito de pensar na vida do outro a partir do que ele me dá e também que há a total possibilidade de ser algo bem diferente do que transparece.

Assim, no filme tudo está fortemente caracterizado para que possa ser transmitido de forma satisfatória a nós espectadores. Mas é clara a necessidade de estigmatização dos personagens e isso me irrita um pouco. Tudo bem, perdoo, pois ainda assim classifico o filme como excelente.

A antropóloga insistindo erroneamente em exercer a maternidade na sua plenitude e se frustrando, o advogado que não consegue passar no exame de Ordem simplesmente porque não quer ser um advogado(e não assume isso a si mesmo e a sua mulher), as mulheres mães que passam as manhãs no parquinho falando da vida dos outros, se esquecendo de olhar para as próprias. A inércia da vida e a necessidade de sempre checarmos o caminho que estamos seguindo. Se não seria tempo de modificá-lo para ficar mais prazeroso e mais com a nossa cara.

E o ponto principal que afeta mais de 70% (estatística essa por mim levantada, sem fundamento científico nenhum!) da vida de casal: A falta de COMUNICAÇÃO e a falta de SINCERIDADE que assumimos, a ponto de, por vezes, pararmos de estabelecer comunicação entre a gente mesmo (isso mesmo, colocar o nosso tico para conversar com o teco)e de sermos sinceros com nossas reais vontades e virtudes.

Aí está o Pecado Íntimo de cada um.

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Agora alguns detalhes:

Fiquei com muita vontade de participar de grupo mensal de discussão sobre algum livro, como elas fazem com Madame Bovary(e claro, não é por acaso). Quando vi as mais velhas, com pensamento bem mais progressistas que a "novata" nova e reacionária, achei engraçado. E esperado.

Quis ter uma piscina pública de qualidade boa aqui por perto para poder ir com os troianos, já que o calor aqui é infernal e eu, assim como eles, amo piscina. E se, por acaso, a piscina fosse frequentada por um pai exatamente como aquele seria algo próximo do paraíso, e eu também iria toda tarde:). Faria até um exame dermatológico para detecção de frieiras para ser aprovada se preciso fosse.

Aquelas bonequinhos com toda ingenuidade que suportam e os relógios batendo impiedosamente escancarando o tempo que se recusa a parar, foram perfeitos para abrir o filme e entendermos o teor dele, que se dane a tradução!
E agora penso no gesto simbólico do tarado do filme(sim, tem um pedófilo ou coisa que o valha) de quebrar todos os relógios em determinado momento: Ali ele estava mostrando que para ele, como para a maioria dos personagens, o tempo não passou, não podia passar. Eles queriam viver na inocência da infância, onde se quer tudo, na mesma hora, mesmo sem nem saber o porquê. E os seres humanos, nas suas taras primordiais, buscando esse prazer imediato.


um beijo,
depois me contem o que acharam do filme!

TiTa

4 comentários:

Eu não sei, você sabe? disse...

não gosto dos textos tão longos.
será que alguém vai parar prá ler?
Oh céus!

Beth Blue disse...

Troia, legal ler a sua interpretação, um pouco diferente da minha pelo ângulo que você pegou - o que não chega a me surpreender porque não apenas vivemos em partes diferentes do planeta como temos vivências bem diferentes (inclusive da maternidade).

só uma coisa não concordo, quando você afirma: A inércia da vida e a necessidade de sempre checarmos o caminho que estamos seguindo. Se não seria tempo de modificá-lo para ficar mais prazeroso e mais com a nossa cara. pela minha experiência nem sempre podemos modificar alguns fatores em nossa vida, nem tudo depende apenas da nossa disposição de mudar. algumas mudanças são mais complexas e demoradas e não dependem unicamente de nós. um dia talvez eu te explique isso melhor!

FELICIDADEetrist... disse...

Pois bem, Titititititititi!!!!
Do título em Português, que nada tem que ver com o original e que diminui o filme, a meu ver, nem dá pra comentar... Já vi uma reportagem sobre o padrão de títulos no Brasil, que segue uma série de regras e não admite sutilezas...
Da história em si, acho que se trata mesmo de adultos que vivem eternamente como criancinhas, deixando a vida levá-los, sem propósitos... Vão vivendo cada dia, vendo o tempo passar, insatisfeitos e incapazes de verdadeiramente lutar por uma mudança ou por qualquer coisa, talvez porque nem saibam exatamente o que é que gostariam de ser, de ter, de fazer...
Várias cenas e momentos me chamaram a atenção. Um deles, que não me sai da cabeça, é aquele em que o loirão resolve dar uma voltinha de skate, mesmo sabendo que sua amante o esperava... Em meio à fuga da vidinha que levava resolveu fazer uma paradinha com a galera de adolescentes... Ai, ai...
Considerei também que o filme se alonga um tanto a mais do que eu gostaria. Meia hora a menos cairia bem.
A filmagem em plano fechado, o tempo todo, dá um clima especial, embora canse um pouco nas salas modernas em que as telas são enorrrrmes.
Um filme de várias criancinhas que cresceram em tamanho tão somente. Que usam o livre arbítrio pra fazerem nada...
E ufa, chega que já falei demais (o filme é bem interessante - é por isso que seu post ficou maior, mas muito bom, Ti!!!!).
Bjs!

Lu

Lunna Guedes disse...

Gostei do filme quando assisti e gostei mais ainda do que você escreveu sobre ele.
Se puder e tiver interesse, envia ele para a Cacau Moretti, jornalista do Bastidores in revista, uma revista cultural...
Achei ótima, o email dela é cacaumoretti@gmail.com e a revista saí mensalmente em são paulo.
Abraços.