domingo, maio 13, 2007

Minha Mãe!


Ela vai reclamar?
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Quando eu nasci, primogênita, faltavam alguns dias para o casal comemorar os nove meses de aniversário de casamento. Motivo que, desde que aprendi a contar e entendi sobre gestação em humanos, usei para atormentar a cabeça de uma mãe. Uma mulher mãe de três meninas que morria de pavor de gravidez indesejada na adolescência, por ver a idéia de vida profissional das filhas cair por terra. Não fazia ela exatamente uma apologia ao casar virgem, mas cuidava como podia para que se pudesse ser assim, que fosse. Besteiras. E eu aproveitava para enchê-la acusando-a de ter transado uns dias antes de casar, só para ver ela brava respondendo que foi tão dicífil se segurar para depois ter de agüentar comentários desse tipo. Quando menstruei pela primeira vez tratou de tirar toda possível poesia da ocasião e ainda no banheiro, comigo sentada na sentina, me disse o que era aquilo: “Agora você pode ficar grávida, ter filho se não estiver preocupada em evitar!”. Sempre nos disse que sexo era bom. É, nunca gostou de mentiras. Tratou de ensinar muito bem isso para mim. Acho, hoje, que isso ajuda na relação mãe-filho, e de fato, em todas as relações. Se uma criança aprende que não deve mentir, simplesmente porque não há necessidade de mentir, as coisas se tornam mais fáceis. E se a criança cresce dessa forma, se verá em apuros quando precisar soltar uma lorota da fina ou da grossa. Eu sou assim, muito fácil reconhecer quando não falo a verdade.

Mulher prática e organizada, planeja e estuda (ih, ela adora usar esse verbo estudar!) muito bem as situações antes delas ocorrerem. Eu assumo, sou incapaz de armazenar tudo que ela guarda na cachola. Professora de história e geografia, teve a honra, você pode calcular, de me dar aulas quando eu estava no ginásio (ah, me recuso falar ensino fundamental, heim!). Eu era agitadinha e por várias vezes ela se via obrigada a mostrar seu pulso forte e me mandar fora de sala, seja para falar com a diretora, seja para ir fazer pesquisas-relâmpago na biblioteca. Eu não entendia nada de história, geografia e tudo que fosse de humanas. Não podia compreender. Demorei muito a ter maturidade para essas compreensões. Ainda na FUVEST tirei nota três em história e só passei porque fui bem em tudo que não era da área de humanas. Demorei muito a gostar de literatura, embora sempre fui chegadinha em ler livros. Ler eu lia, como uma geminiana, que fique claro. Lê um livro enquanto a TV dá uma luz de fundo e o rádio toca uma canção gostosa. Todos os canais misturados. E esse gosto pela leitura posso ter herdado dela, que sempre tem ao menos um livro na cabeceira e adora conversar sobre eles depois. Não tenho nem metade da capacidade dela para ler.

E voltando ao assunto sinceridade, adorava dizer que a pior coisa do mundo era aquilo que os HOMENS chamavam de parto normal. Gostava de frisar. Ela teve três, com quadro muito florido de dores, fique claro. Do tipo reinvidicativa, sempre tem algo a reinvidicar (sem dúvida daria uma ótima advogada). Entre uma contração e outra dizia o óbvio : parto normal só é dessa forma arcaica porque não é o homem que pare. Se fosse o homem algo já teria sido feito a respeito. Bem, isso há quase 35 anos. Hoje já existe analgesia de parto, mas infelizmente, não deliberadamente espalhada como deveria. Mudanças ocorreram e olha que nem é o homem que dá a luz, embora gostaria muitíssimo de ver o Carlão grávido na próxima gestação nossa, coisa que ele nem cogita. Sem dúvida, o fato de ela criticar tanto, era um grande motivo para eu de fato sonhar em ter parto normais. Para, de certa forma, eu saber sobre o que ela tanto falava e sentir na pele a questão que já ganhava até um status de lenda. E dessa forma me legitimar como mãe também. Quem sabe até não foi esse o motivo de escolher ser ginecologista e obstetra. Mães têm culpa de quase tudo nas nossas vidas e como mãe entendo disso.

Mulher multi presente, sempre era ela que levava e buscava nas baladas juvenis que não eram exatamente baladas(muito moderno) e sim, bailinhos (ótima essa, né?) shows, cinemas...essas coisas da década de oitenta. Os meninos amigos, dentre os poucos que eu conseguia arrumar, pois estudava em colégio de freiras só de meninas, costumavam dizer que minha mãe carregava um “três-oitão” na bolsa, para não se ver em apuros com suas meninas. Ela sentia um desconforto com a piada, mas no fundo acho que gostava. Super-mãe!

Eterna apaixonada pelo meu pai, isso é uma coisa que reconheço e guardo como exemplo. Eles são muito diferentes, mas por detrás de tanta diferença acabam se entendendo tão bem. Sempre dizia que o homem deve ser mais apaixonado que a mulher, mas tenho certeza que não era exatamente isso que ela queria nos dizer. Ela queria dizer: “Amem muito, mas não sejam trouxas, em primeiro lugar vocês!”. Ao menos foi assim que aprendi essa lição, e mesmo não me sabendo tão capaz de amar um homem, sou totalmente apaixonada pelo que escolhi. Espelho do que vejo em casa? Pode ser, sim! Sobre casamento, também, nunca cansou de me alertar para nunca, nunquinha catar a primeira cueca do chão, pois receberia esse desígnio até o final do casamento. Dica boa essa.

Aprendi com ela também ter o mesmo amor desinibido pelas filhas. Amor do tipo que abre a carteira na fila do banco para mostrar a foto das três com sorrisos quilométricos (como é a marca registrada da família), apontando um mini-currículo de cada uma. Coisas de mãe, que me vejo totalmente capaz de repetir.

Não sei dimensionar o quanto dela está em mim, mas sei que muito mais deixei de aprender com ela, pois nunca mesmo terei capacidade de fazer múltiplas tarefas como ela, que faz o que for preciso, e nunca se vê satisfeita senão quando termina a tarefa que julgou ser necessária. Ela precisa ter esse sentimento de missão cumprida. É capaz de caçar rato num armário, de pintar quadros, desentupir ralo, de bordar, de fazer texto de agradecimento ou qualquer que seja, de passar uma demão de sei lá o que num móvel, de limpar o lustre, de fazer tarefas domésticas, fazer o imposto de renda como poucos, de engraxar sapatos, de cozinhar (hummmm, nessa ela é muito boa!). Não tem preguiça para nada e isso é muito digno e diferente de mim.

Mami, tudo que eu escrevi aqui, em meio a sentimento açucarado de amor genuíno, é obviamente muito pouco para deixar registrada a importância que tem em minha, e em nossas vidas.(e com certeza ainda é muito mais do que metade da minha carga genética!).

Um beijo muito especial pra você hoje, e até o almoço!

Tita.

2 comentários:

FELICIDADEetrist... disse...

Uaaaau! É certo que tanto de bom que há em você é culpa dessa linda pessoa que é sua mãe. Se vc não se acha tão múltipla e desenvolvida como ela, que realmente é especial, tenha certeza de que está no caminho... Você é ótima, Ti! E ela tem uns aninhos na sua frente, oras...
ParaBÉNS pras duas, queridasmaisdoquequeridas!
FELIZ DIA DAS MÃES de verdade, porque vocês duas, Lúcia e Tititi, são das que maaaaais merecem!
Beijos,
Lu
P.S. esse foi um dos textos mais lindos e maduros que vc fez!

FELICIDADEetrist... disse...

Voltei pra dizer que ela não pode ficar brava, porque a foto está linda!!! Veja só, até linnnda essa Mami é....
Mais beijos com carinho,
Lu